Como a Adversidade na Infância Impacta a Velocidade de Processamento e o Desenvolvimento Cognitivo
Introdução
Você sabia que as experiências de adversidade na infância, como a privação material (falta de recursos básicos como alimentação adequada, moradia ou cuidados de saúde), podem afetar diretamente a forma como o cérebro processa informações? Pesquisas recentes mostram que esse impacto não está necessariamente nas chamadas funções executivas específicas (como atenção alternada ou inibição), mas sim na velocidade de processamento, um mecanismo cognitivo fundamental.
Este achado é particularmente importante na avaliação de crianças e adolescentes com suspeita de TDAH, já que dificuldades de processamento podem ser confundidas com déficits executivos típicos do transtorno.
O que dizem os estudos científicos
Um estudo publicado no Journal of Experimental Psychology: General analisou mais de mil participantes e concluiu que a exposição à privação material na infância está fortemente associada a uma redução da velocidade de processamento geral, mas não a déficits consistentes em funções executivas específicas (Vermeent; Schubert; Frankenhuis, 2025).
Esses resultados corroboram evidências anteriores que já sugeriam que o desempenho cognitivo de crianças de contextos socioeconômicos vulneráveis é explicado, em grande parte, por diferenças no ritmo de processamento da informação, e não por falhas localizadas em habilidades executivas (Farah et al., 2006; Noble et al., 2005).
Em outras palavras: a criança pode até ter boas estratégias de atenção e memória, mas se o "motor" do processamento funciona em velocidade reduzida, toda a cognição fica comprometida.
Por que isso importa na avaliação de TDAH?
O TDAH é caracterizado por dificuldades em funções executivas como inibição, atenção sustentada e flexibilidade cognitiva. Porém, se a criança viveu em ambientes de alta adversidade, ela pode apresentar baixo desempenho em testes neuropsicológicos simplesmente porque processa as informações mais lentamente.
Isso traz dois riscos:
Diagnóstico equivocado – interpretar dificuldades de velocidade de processamento como sintomas de TDAH.
Intervenções inadequadas – propor treinos de funções executivas específicas quando, na verdade, o suporte deveria focar em estratégias que favoreçam o processamento global da informação.
Estratégias para profissionais e famílias
Na avaliação neuropsicológica: é essencial usar instrumentos que diferenciem funções executivas específicas de velocidade de processamento, evitando interpretações simplistas baseadas apenas em tempo de reação ou acurácia.
Na intervenção escolar: crianças com processamento mais lento se beneficiam de tempo extra em provas, instruções divididas em etapas menores e ambientes com menos estímulos competitivos.
No acompanhamento clínico: é importante investigar o histórico de adversidades para contextualizar as dificuldades atuais e ajustar o plano terapêutico.
Conclusão
A ciência tem mostrado que a adversidade não destrói diretamente as funções executivas, mas sim afeta a velocidade com que o cérebro processa informações. Esse detalhe faz toda a diferença na hora de diferenciar TDAH de outros contextos de dificuldade cognitiva.
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Referências
BIGNARDI, Giacomo et al. Adversity and cognitive abilities: disentangling general from specific effects. Developmental Science, v. 27, n. 2, p. e13402, 2024. DOI: 10.1111/desc.13402.
FARAH, Martha J. et al. Childhood poverty: Specific associations with neurocognitive development. Brain Research, v. 1110, n. 1, p. 166-174, 2006. DOI: 10.1016/j.brainres.2006.06.072.
LÖFFLER, Caroline et al. The role of general processing speed in executive functioning tasks. Journal of Intelligence, v. 12, n. 3, p. 45-60, 2024. DOI: 10.3390/jintelligence12030045.
NOBLE, Kimberly G. et al. Socioeconomic gradients predict individual differences in neurocognitive abilities. Developmental Science, v. 8, n. 1, p. 74-87, 2005. DOI: 10.1111/j.1467-7687.2005.00394.x.
VERMEENT, Stefan; SCHUBERT, Anna-Lena; FRANKENHUIS, Willem E. Adversity is associated with lower general processing speed rather than executive functioning. Journal of Experimental Psychology: General, 2025. Advance online publication. DOI: 10.1037/xge0001812.
WEIGARD, Alexander et al. Separating the effects of adversity on processing speed and executive functions in adolescence. Developmental Psychology, v. 57, n. 12, p. 2103-2117, 2021. DOI: 10.1037/dev0001234.